domingo, 28 de dezembro de 2008




Há alturas em que celebramos a passagem do tempo, no esquecimento propositado de que o ano que passa nos conduz ao último a passar, aquele que nos conduzirá à outra passagem, para quem assim espera, ou a coisa nenhuma, para quem nada espera.



Quem nos olhar de outro planeta, com a objectividade que a estranheza permite, perguntará o que festejamos nós e porque nos rimos, entre abraços e foguetes, perante o facto inelutável de nos termos aproximado mais 12 meses do total de meses que nos são dados.

Quando olhos para os adolescentes ‒ os que tenho em casa e os outros ‒ recordo como a vida naquela altura parece um daqueles pães que milagrosamente se multiplicam, apesar de se irem comendo com gosto. E se a ânfora do vinho também se renovar, à mesma medida do pão, então aproveite-se a boda, enquanto nos é dada a ilusão dos lábios molhados e dos dedos enfarinhados.

Quando olho para os velhos ‒ os meus, que me dão a mão no sentido inverso ao que antes davam, e os outros, com as mãos mais vazias do que as dos meus ‒ e vejo os olhos que se aclaram por entre o cálice das rugas, pergunto-me como será olhar para o copo depois de bebido o licor quase até à última gota.

Com a taça a meio, molho o dedo no champanhe e vejo-o filtrar a luz, em travos amargos e doces. Faço-me surda aos foguetes, com a sua perturbada explosão de flores efémeras. Sento-me na areia e espero a próxima maré cheia.