segunda-feira, 12 de janeiro de 2009

Back to Africa

Nunca gostei de frio. Sou uma alma de paisagens quentes com som de ondas ao fundo e estes dias gelados que nos têm perseguido produzem em mim o efeito de fuga.
Embrulho-me em cachecóis e recolho-me às lembranças de onde não havia frio. Lá longe na infância africana.
Quando os caranguejos ousavam fazer corridinhas pela beira da água, na Baía Fernão Veloso.


Era a minha praia preferida e, nesses tempos, as distâncias eram muito grandes mas venciam-se com facilidade. Duzentos quilómetros de avião (um pequeno Dakota enfeitado com cortinas de flores às pintinhas) e podia-se chegar ao mar aí pelas sete da manhã (o sol nascia às cinco).
Parecia que ele, o mar, estava lá só porque lhe tínhamos mandado dizer que íamos, tão perfeito era, tão incapaz de nos desiludir, como um dedo divino pousado sobre as nossas pálpebras.

A cidade ficava no interior, de prédios baixos e largas avenidas traçadas a régua e esquadro, como acontece sempre com as cidades novas, construídas de raíz para responderem a necessidades inesperadas. Era uma cidade quente, familiar e ajardinada. Dizem-me que agora já não é tanto, parece que não há muito ânimo para a paciência namoradeira que os jardins exigem.


Era a terceira cidade. Ao domingo, na feira do pau-preto, vendiam-se por uma "quinhenta" (cinco tostões) caixas, caixinhas, esculturas e cestas.



No horizonte recortava-se a Cabeça-do-Velho, aquela montanha azul ao fundo que se via de todas as janelas.



Antes tinha eu morado na segunda cidade. Se fechar os olhos, ainda consigo sentir o cheiro das acácias que bordavam os jardins da Ponta Gea. Também tive um, onde me perdia como se fosse uma floresta. Mas era porque eu era muito pequena então e tudo me parecia demasiado grande.

Às vezes viajava para a primeira cidade. Aquele ali, atrás da catedral, é o prédio Funchal, onde costumava ficar, algures numa daquelas janelas do sétimo andar.

Esta era uma cidade grande, a maior que eu conhecia nesses tempos, muito diferente da pequena Lisboa, onde tudo me pareceu estreito e velho, quando cheguei.


Mas o sítio mais bonito de todos era a Ilha.

De antigas casas portuguesas inesperadamente acomodadas em ruas tropicais.


E de candeeiros de esquina indiferentes ao sol, como se ali tivesse pousado um eterno Gama acabado de chegar do Bairro Alto.