Ultrapassada que está a asteriscal quadra (vede, Capitão, o respeito por vossas artérias) de positivas afirmações de valores, proponho-vos agora uma madura reflexão sobre os limites e os limiares da existência. Aproximamo-nos do dia em que olharemos para o caderninho do ano transcorrido, riscaremos as proposições alcançadas e transferiremos para o caderninho seguinte aquelas que ainda não foi desta.
Decorridas, há postais atrás, tomadas de posição contra existencialismos literários, em que eu própria lancei sobre a sartreana náusea o anátema do ilegível, proponho agora chamar as consciências à crueza da meditação especulativa.
Quantos de nós não pensámos já que a vida é inerentemente miserável e irracional? Não nos recordamos todos da angústia sentida quando a garrafa butano se acabava (na era pré-gás natural) a meio do gel de duche?
Decorridas, há postais atrás, tomadas de posição contra existencialismos literários, em que eu própria lancei sobre a sartreana náusea o anátema do ilegível, proponho agora chamar as consciências à crueza da meditação especulativa.
Quantos de nós não pensámos já que a vida é inerentemente miserável e irracional? Não nos recordamos todos da angústia sentida quando a garrafa butano se acabava (na era pré-gás natural) a meio do gel de duche?
Quantos não exclamámos já, pelo menos interiormente, «Ah, l'enfer, c'est les autres!», permitindo que o nosso vizinho de banco se deixasse descair sobre o nosso ombro, vencido por um dia de duro labor e pela barbárie injustificada da loucura quotidiana?
Quantos não lamentámos, pelo menos uma vez, o peso da responsabilidade de sermos livres e não increpámos Agostinho, o santo do livre arbítrio, murmurando: «Não tive culpa, puseram-me o cálice à frente...»