Todas as épocas tiveram as suas epidemias. A que mais séculos atravessou foi, provavelmente, a da peste bubónica, transmitida pelas pulgas que viajavam nos ratos e que proliferavam sobretudo nas cidades, onde a população se acotovelava e o lixo se atirava para a rua. D.Manuel foi o primeiro rei português a mandar construir uma lixeira fora dos muros da cidade de Lisboa e só depois disso os surtos de peste começaram a diminuir.
Filipa de Lencastre morreu dela. O seu primogénito, homem culto e curioso pelas ciências, tinha um caderninho onde apontava várias coisas de que queria guardar lembrança.
Era assim uma espécie de Moleskine régio.
Nele apontou o Duarte a seguinte receita para preparação do mais usado remédio contra a peste:
«Toma um texugo vivo e ata-lhe os pés e as mãos em maneira que lhe possas dar a beber isto que te aqui dirão: aljôfar e corais vermelhos e cânfora, de cada um meia onça; ouro, três coroas bem limadas. Tudo isto bem moído num almofariz, mistura-o num quartilho de vinho branco e depois de muito bem misturado dá-o a beber ao texugo por um corno pequeno, furado, mantendo-lhe a cabeça alçada e a boca aberta. Depois de ter bebido tudo, deixem-no estar um pouco e degolem-no e tirem-lhe o sangue e tomem-lhe quatro ou cinco dentes e do fígado e do coração e dos miolos e da pele queimada, de cada um meia onça e seja tudo bem pisado e misturado com o sangue. Mistura-lhe mais canela, genciana, gengibre, cravos e mirra. Tudo isto misturado com o sangue, seja bem peneirado e posto a secar onde não lhe dê o sol e lhe dê o ar. Depois de seco, pisem-no bem e guardem-no para quando for preciso».
Suspeito de que deve ter sido ali, por volta de 1437, que alguém terá inventado a frase "Mais vale morrer do mal do que da cura". É que o tratamento do doente empestado com estes «pós de texugo» também exigia procedimentos exóticos que seria longo descrever mas que me faz olhar com simpatia a farmácia do meu bairro, cheia de antibióticos em cápsulas coloridas e sintetizadas.
Era assim uma espécie de Moleskine régio.
Nele apontou o Duarte a seguinte receita para preparação do mais usado remédio contra a peste:
«Toma um texugo vivo e ata-lhe os pés e as mãos em maneira que lhe possas dar a beber isto que te aqui dirão: aljôfar e corais vermelhos e cânfora, de cada um meia onça; ouro, três coroas bem limadas. Tudo isto bem moído num almofariz, mistura-o num quartilho de vinho branco e depois de muito bem misturado dá-o a beber ao texugo por um corno pequeno, furado, mantendo-lhe a cabeça alçada e a boca aberta. Depois de ter bebido tudo, deixem-no estar um pouco e degolem-no e tirem-lhe o sangue e tomem-lhe quatro ou cinco dentes e do fígado e do coração e dos miolos e da pele queimada, de cada um meia onça e seja tudo bem pisado e misturado com o sangue. Mistura-lhe mais canela, genciana, gengibre, cravos e mirra. Tudo isto misturado com o sangue, seja bem peneirado e posto a secar onde não lhe dê o sol e lhe dê o ar. Depois de seco, pisem-no bem e guardem-no para quando for preciso».
Suspeito de que deve ter sido ali, por volta de 1437, que alguém terá inventado a frase "Mais vale morrer do mal do que da cura". É que o tratamento do doente empestado com estes «pós de texugo» também exigia procedimentos exóticos que seria longo descrever mas que me faz olhar com simpatia a farmácia do meu bairro, cheia de antibióticos em cápsulas coloridas e sintetizadas.