Cáceres, capital da Alta Extremadura, é uma cidade de pedras conservadas. Noutros lugares, o tempo e o sol abrasador consumiram a memória dos passos que atravessavam as ruas. Aqui não. Durante a hora da siesta, quando todos dormem, só os viajantes estrangeiros se atrevem por entre as ruelas estreitas da cidade antiga. É fácil parar por uns segundo e ouvir dobrando a esquina um trote de cavalos puxando uma carruagem. Vemo-la entrar, vinda da Plaza Mayor.
Tão perto que quase saltamos de susto, rostos vigilantes estavam já há alguns minutos espreitando sobre o nosso ombro.
Alguns de face inquietante.
Também nos observam janelas fugidias, que guardam segredos que nunca nos serão revelados,
ainda que por vezes se enfeitem de pombas.
Por ali tudo se some e esconde nas sombras dos arcos.
Vislumbramos neles o rasto fugaz de um vestido de seda. Quem será?
A carruagem parou. Ouvem-se os gritos dos moços que acorrem à voz do cocheiro. Abrem-se as portas do palácio Toledo-Moctezuma.
Da carruagem desce uma menina, de vestido de seda brocada arrastando nas pedras do chão. Desaparece rapidamente atrás da porta, que se fecha. Mas não sem que antes lhe possamos ver o rosto moreno de negros cabelos de azeviche e apreciar o porte altivo. É a bisneta de Isabel.
O palácio foi mandado construir, lá para finais de quinhentos, por um nobre de Espanha: Juan de Moctezuma, neto da princeza azteca Tecuixpo Ixtlaxochitl, filha do imperador Moctezuma II, cujo império foi destruído por Hernán Cortès, quando ela tinha 12 anos. Apesar de longamente ter resistido ao invasor, acabou por ser violada por ele e acabou por casar com um espanhol, de quem teve vários filhos. Foi baptizada Isabel de Moctezuma. Os seus descendentes, estabelecidos em Cáceres, orgulhavam-se da ascendência imperial índia e do nome.