terça-feira, 28 de agosto de 2007

Geografia das Estrelas


Perdi-me no horizonte com tanto azul e tanto vento. Perdi a vista da terra, de onde me lançara a pé firme. Cheia de sede, embarquei. Levava no bolso de umas velhas calças de marinheiro, que comprei há muito tempo na Feira da Ladra, o meu breviário. Nele leio as horas espaçadas da solidão.
O meu barco tem três velas. Uma é velha e experiente de toda a sorte de marés. As outras duas são do melhor pano que pude encontrar num armazém de retalhos coloridos. Abraçam-se as três quando o temporal ameaça e rompem todas as intempéries. Sinto-me confiante quando vejo as três de peito erguido à maresia, tão diferentes mas tão afinadas quando entoam a bombordo uma canção de sereias.
O meu rumo não tinha coordenadas. A Praia das Estrelas fica em Não-Sei-Onde. A caminho.



Apesar de possuir um mapa, que um velho pirata me pediu que guardasse em segredo, atravessei mares desconhecidos, deixei os tritões enlouquecerem o leme do meu barco, fazendo-o rodar em volta de muitas ilhas. Ilhas falsas, feitas de bruma enganadora. A geografia dos pés e dos barcos nunca é bem como os piratas a desenham. Toda a gente sabe que os piratas são uma gente pouco real e que bebe rum ao pequeno almoço.
Um dia aportei a um areal tão doce que resolvi descer a terra firme. Tinha as pernas dormentes, de tanto balanço no mar. Arregacei as minhas calças de marinheiro para não as molhar (só trouxe estas), acendi o meu cachimbo e desci à praia.
Ali estavam elas, à minha espera. As Estrelas.
Agora sim, tinha valido a pena a viagem, por uma mão cheia de estrelas.